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Vereadores de Santos aprovam moção contra decreto que limita cidadania italiana; entenda

Por Santa Portal em 22/04/2025 às 10:00

Divulgação
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Unindo-se a um movimento mundial, a Câmara Municipal de Santos expressou posicionamento contrário às mudanças impostas pelo governo italiano à política de concessão de cidadania por meio do “Decreto Tajani”. A Moção de Repúdio nº 19/2025, apresentada no último dia 10 pelo vereador Zequinha Teixeira (PP), contou com a assinatura dos 21 vereadores da Casa.

O Decreto 36/2025, informalmente batizado de “Decreto Tajani”, em alusão ao atual Ministro das Relações Exteriores da Itália, Antonio Tajani, entrou em vigor no dia 28 de março. O texto determina que, a partir dessa data, somente filhos e netos de italianos poderão solicitar a cidadania italiana por direito de sangue (jus sanguinis), excluindo bisnetos, trinetos e demais descendentes – mesmo que possuam documentação comprobatória e vínculo cultural estabelecido.

Outra mudança significativa é a centralização do processo de reconhecimento da cidadania no Ministério das Relações Exteriores da Itália (Farnesina), retirando essa competência dos consulados italianos no exterior. A medida tem previsão de ser regulamentada em até um ano, período durante o qual os consulados deverão adaptar seus processos à nova norma.

A moção de repúdio aprovada pela Câmara de Santos denuncia o decreto como um grave retrocesso jurídico e humanitário, citando violações aos princípios do direito internacional, discriminação contra cidadãos estrangeiros com ascendência italiana e insegurança jurídica pela aplicação retroativa da norma.

“O motivo veio de um pedido de um grupo de pessoas que são descendentes de italianos e estavam buscando documentos e entrando no consulado para conseguir a cidadania italiana para seus filhos. Com o novo decreto, só será possível conseguir cidadania e passaporte europeu pela Itália quem for neto ou filho de italiano. Quem for bisneto em diante, hoje, não tem mais direito”, declarou o vereador Zequinha Teixeira ao Santa Portal.

Em sua moção, o parlamentar ressalta que a cidadania italiana sempre foi um direito transmitido por laços de sangue, sem limite de gerações, desde que o vínculo fosse devidamente comprovado. Para ele, o novo decreto “afronta essa tradição legal consagrada” e seu impacto pode ser devastador para famílias inteiras que já haviam iniciado processos ou planejavam fazê-lo.

De acordo com o advogado Fábio Gioppo, CEO do escritório Gioppo & Conti, a medida pode ser considerada inconstitucional em vários aspectos. Ele aponta a ausência de urgência como um dos principais problemas, já que o decreto foi publicado como um “Decreto-Lei”, que só pode ser utilizado em situações emergenciais. “A questão da cidadania italiana por descendência não configura uma emergência nacional ou imprevisível”, afirma o especialista em Direito Internacional e Cidadania Europeia.

Para Gioppo, outro ponto crítico é a retroatividade irregular da norma: o decreto passou a valer às 0h01 do dia 28/03, mas só foi publicado oficialmente às 23h do mesmo dia, o que viola o princípio da legalidade e da previsibilidade jurídica. Além disso, a limitação da cidadania a apenas duas gerações desrespeita a jurisprudência consolidada da Suprema Corte de Cassação Italiana, que reconhece o direito originário à cidadania por descendência sem limite de gerações.

A exigência de comprovar um “vínculo real com a Itália”, introduzida pelo decreto, também é considerada subjetiva e excludente, abrindo margem para interpretações arbitrárias por parte da administração pública.

Impacto no Brasil

O Brasil abriga mais de 30 milhões de descendentes de italianos, segundo estimativas de entidades ítalo-brasileiras. O passaporte italiano oferece acesso ao mercado de trabalho europeu, descontos em universidades e liberdade de circulação no espaço Schengen – uma área de livre circulação na Europa onde pessoas podem viajar entre os países membros sem necessidade de apresentar passaporte ou visto.

“Essa decisão afeta milhares de descendentes de italianos, não só em Santos, mas em todo o Brasil. O passaporte ajuda a ter desconto em faculdades europeias, por exemplo, além de acesso livre a todos os países da União Europeia”, reforçou Zequinha Teixeira.

Apesar da entrada em vigor do Decreto Tajani, o especialista ressalta que a via judicial continua válida e segura para o reconhecimento da cidadania. Isso porque o direito jure sanguinis é considerado originário e não pode ser retirado por decreto infraconstitucional, segundo interpretações anteriores da justiça italiana. “

Há caminhos legais e estratégias jurídicas plenamente válidas, especialmente por meio da via judicial, que permite o reconhecimento da cidadania com base em direitos consolidados”, tranquiliza Gioppo. O Decreto Tajani ainda precisa ser convertido em lei pelo Parlamento Italiano em até 60 dias após sua publicação. Caso contrário, ele perde sua validade automaticamente.

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