Juiz reconhece dolo eventual ao condenar advogado a 4 anos por agredir mulher
Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 05/06/2025 às 16:00

O juiz Robério Monteiro de Souza, do 2º Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Maceió (AL), rejeitou a tese defensiva de que o criminalista João Francisco de Assis Neto não teve intenção de ferir a sua companheira e reconheceu que ele agiu com dolo eventual. O advogado foi condenado a quatro anos e dois meses de reclusão, em regime inicial fechado, por lesão corporal no âmbito de violência doméstica.
O réu poderá apelar solto, mas com tornozeleira eletrônica. A decisão foi prolatada em audiência realizada na terça-feira (3), na qual a vítima foi ouvida, oito testemunhas depuseram e houve o interrogatório do acusado. Entre o recebimento da denúncia e a prolação da sentença transcorreram 39 dias. O juiz também condenou o criminalista a indenizar a mulher em R$ 40 mil, a título de reparação dos danos físicos e emocionais.
“O réu, mesmo diante de uma situação de tensão, agarrou com força sua companheira pela cintura, tentando retirá-la à força da cama”, destacou o julgador. Segundo ele, quem, em sã consciência, agride alguém dessa maneira, não pode alegar ausência de previsão ou negligência. “A conduta revelou clara assunção do risco do resultado, o que afasta a caracterização culposa e impõe o reconhecimento do dolo eventual”.
Queda e lesão
Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), no último dia 14 de abril, ao se desentender com a vítima, com quem mantinha união estável e residia há dois anos, o réu tentou expulsá-la do apartamento do casal, na capital alagoana. Para tanto, passou a empurrá-la, provocando a sua queda. A mulher bateu o queixo no chão e sofreu lesão leve, mas que causou “sangramento intenso e ininterrupto”, precisando levar três pontos.
Com base nesses fatos, registrados por câmeras de segurança do prédio, o MP pleiteou em suas alegações finais a condenação do criminalista por lesão corporal dolosa no contexto de violência doméstica (artigo 129, parágrafo 9º, do Código Penal). Também requereu indenização para reparação dos danos causados pela infração, no valor mínimo de R$ 40 mil, nos termos do artigo 387, inciso IV, do Código de Processo Penal.
Outros pedidos feitos pelo MP foram o arbitramento em favor da vítima de pensão alimentícia provisória de R$ 20 mil por mês, retroativa à data do fato, a ser paga pelo réu, impondo-lhe ainda a reativação do plano de saúde da mulher, suspenso após o episódio. A defesa postulou a desclassificação do crime para lesão corporal culposa (artigo 129, parágrafo 6º, do CP) e o indeferimento dos pleitos de caráter pecuniário.
Por fim, a defesa requereu a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direito, bem como a retirada da tornozeleira eletrônica ou a suspensão do “raio zero”. Autuado em flagrante, João Neto teve a prisão preventiva decretada em audiência de custódia. Um mês depois, no dia 13 de maio, a Justiça lhe concedeu liberdade provisória, mediante a imposição de medidas cautelares, entre elas o monitoramento eletrônico.

Dosimetria
Robério de Souza estabeleceu a pena-base em cinco anos de reclusão, que é o teto previsto em lei. A mínima é de dois anos, mas o julgador fundamentou a fixação no patamar máximo em razão da “culpabilidade elevada” do criminalista, que resulta em maior reprovabilidade da sua conduta, e das circunstâncias do delito, “praticado dentro do lar conjugal, local que deveria ser de proteção e segurança para a vítima”.
De acordo com o juiz, o caso repercutiu nacionalmente e a vítima sofreu forte abalo emocional, pois teve a imagem exposta em redes sociais e na mídia. “O réu é advogado, profissão essencial à justiça, é digital influencer com milhões de seguidores, pessoa pública cuja postura deveria refletir respeito às leis e aos direitos fundamentais. Sua conduta afronta diretamente o que se espera de alguém com tal representatividade”.
Com o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, que resultou na redução da pena-base em um sexto, e diante da ausência de causas de aumento ou diminuição, a sanção definitiva ficou estabelecida em quatro anos e dois meses. A fixação do regime inicial fechado e a não substituição da pena reclusiva por restritivas de direito decorrem das circunstâncias judiciais “preponderantemente desfavoráveis”, anotou o magistrado.
Quanto aos pedidos de pensão alimentícia provisória e de reativação do plano de saúde, o julgador ponderou que eles devem ser analisados pelo juízo cível, na qual inclusive tramita ação. Em relação ao monitoramento eletrônico, Souza flexibilizou o raio de circulação do réu para todo o Estado de Alagoas. Antes, ele estava restrito apenas para deslocamentos a consultas médicas, desde que previamente comunicadas ao juízo.
OAB suspende
Em julgamento realizado no dia 8 de maio, o Tribunal de Ética e Disciplina (TED) da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA) suspendeu preventivamente por 90 dias, prazo máximo permitido, o advogado João Neto. Segundo comunicado da entidade, a medida não decorreu da prisão em flagrante do criminalista por agredir a mulher em Maceió, no mês de abril.
“A suspensão preventiva, no entanto, ocorreu em um processo ético-disciplinar anterior à prisão. Trata-se de um processo instaurado no TED da OAB-BA devido à gravidade de condutas incompatíveis com a dignidade da profissão e com o exercício profissional da advocacia, em inúmeras falas do advogado João Neto em redes sociais e em diversos veículos jornalísticos, dentre outras condutas irregulares”, informa a nota.
*Texto por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News