Cabotagem pode ser protagonista de transição energética no transporte marítimo brasileiro

Por Rodrigo Cirilo em 28/08/2025 às 14:31

Crédito: José Luiz Borges
Crédito: José Luiz Borges

A cabotagem tem o potencial de desempenhar um papel crucial na urgência pela descarbonização do transporte marítimo e na transição energética do Brasil. No entanto, o processo “não é uma jornada simples ou ágil, e há muito trabalho pela frente nos próximos anos”, como foi discutido no segundo painel do IX Congresso de Direito Marítimo e Portuário da ABDM, realizado nesta quinta-feira (28), no Hotel Sheraton, em Santos, no litoral de São Paulo.

Moderado pelas advogadas Cristina Wadner, associada da ABDM, e Maria Cristina Gontijo, professora da Unisanta, o painel teve o tema “Transição energética, descarbonização e créditos de carbono no transporte marítimo”. A conversa contou com as participações de Cristina Castro, superintendente de ESG e Inovação da Antaq; Neusa Ferreira Marcelino, CEO da CMA CGM do Brasil; Luiza Bublitz, CEO da Aliança Navegação e Logística; e o presidente da ABDM, Luis Felipe Galante.

O transporte aquaviário é responsável por cerca de 90% do comércio internacional e aproximadamente 3% das emissões globais de gases de efeito estufa (GEE). Nesse cenário, a CEO da Aliança Navegação e Logística destacou que o Brasil, com uma costa de mais de 8.400 km e 80% da população vivendo a menos de 200 km do litoral, surge como um dos países com maior potencial para tornar a cabotagem um vetor estratégico da transição energética.

“A cabotagem hoje representa apenas 12% da matriz de transporte no Brasil. Se isolarmos os contêineres, o índice é ainda menor. É impossível pensar em uma transição energética séria sem considerar esse modal”, afirmou Luiza Bublitz.

Ela também ressaltou que a transição energética não se limita à troca de combustíveis nos navios, mas envolve toda a cadeia logística: portos, transporte terrestre e armazéns. “Temos uma meta global de nos tornarmos net zero até 2040. Para isso, estamos investindo em tecnologia e inovação em todos os elos da cadeia: navio, carreta, trem, armazém e operação portuária”.

A CEO mencionou ainda o projeto de conexão elétrica entre navios e terminais. “Hoje, na rota Manaus-Sudeste, uma embarcação de cabotagem passa até 40% do tempo parada em porto. Com a eletrificação, poderemos desligar o motor do navio durante essas operações, reduzindo em até 95% as emissões nesse período. Cinco embarcações da nossa frota já estão preparadas para isso”, revelou.

Integração multimodal

A empresa realiza testes com carretas elétricas em estados como São Paulo, Bahia e Santa Catarina, com percursos de até 230 km, e investe em armazéns sustentáveis com painéis solares, reaproveitamento de água da chuva e gestão de resíduos.

Para Bublitz, a integração multimodal é essencial para reduzir as emissões e tornar a logística nacional mais eficiente. “Se conseguirmos sincronizar melhor os modais, otimizar rotas, retirar caminhões das estradas em longas distâncias e dar escala à cabotagem, conseguiremos transformar esse modal em protagonista da descarbonização no Brasil”, defendeu.

Ela destacou que, apesar dos avanços, ainda há muito a ser feito para integrar esforços e fazer da cabotagem uma verdadeira protagonista na transição energética. Além disso, a CEO criticou também a ausência da cabotagem nos compromissos internacionais assumidos pelo Brasil.

“O Brasil assinou o documento NDC [plano de ação climática que cada país submete para reduzir a emissão de gases de efeito estufa e se adaptar às mudanças climática], alinhado à IMO, com metas ambiciosas de redução de até 67% nas emissões até 2050 em relação a 2005. Mas o plano nacional não cita a cabotagem. Isso é uma falha grave diante do potencial que temos”, afirmou.

Créditos de carbono e pesquisa

Neusa Ferreira Marcelino, da CMA CGM do Brasil, reforçou a importância dos créditos de carbono como instrumento de incentivo à transição, mas alertou que o Brasil ainda está engatinhando nesse setor. “É possível monetizar os ganhos ambientais, mas no país ainda não vemos isso acontecer de forma estruturada”, disse.

“O Brasil tem condições únicas para a transição energética, mas ainda falta enxergar esse potencial e incorporá-lo em seus compromissos climáticos. Precisamos de novas obrigações contratuais e recompensas em créditos”, concluiu Luis Felipe Galante, presidente da ABDM.

Cristina Castro, superintendente de ESG e Inovação da Antaq, destacou a vanguarda brasileira na produção de combustíveis sustentáveis para garantir segurança energética em comparação a países europeus. No entanto, ponderou o baixo investimento em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I).

“Desde a década de 1970, o Brasil investe apenas 1,5% do PIB em PD&I. Estávamos muito próximos de outros países, como a China, naquela época. Hoje, o Brasil investe 1,3%. A solução não é burocratizar, mas aumentar o investimento em pesquisa, desenvolvimento e inovação para otimizar viagens, por exemplo”, apresentou.

IX Congresso de Direito Marítimo e Portuário – ABDM

O IX Congresso de Direito Marítimo e Portuário – ABDM é uma realização da Associação Brasileira de Direito Marítimo (ABDM – Seccional de São Paulo), Sistema Santa Cecília de Comunicação e Universidade Santa Cecília (Unisanta). O evento tem patrocínio da Brasil Terminal Portuário, Centro Nave, Santos Brasil, Sopesp, Eldorado Brasil, Praticagem de São Paulo, Marimex, Ecoporto Santos, Ciesp Fiesp, Terminal Concais, DP World, Fenamar, Associação Brasileira dos Terminais e Contêineres, ATP Portos Privados, ABTP, Abtra, Fenop e Autoridade Portuária de Santos (APS).

Apoio: Sammarco Advogados, Escritório Jurídico Carbone, Cris Wadner, Kincaid | Mendes Vianna Advogados, Salomão Advogados, LP LAW | Lopes Pinto, Pedro Calmon Filho & Associados, Proinde, Revoredo Advocacia, Mattos Filho e Reis Braun Regueira Advogados.

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