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11/06/2025

Cotado para assumir SSP tem discurso humanista e foi investigado por abuso de autoridade

Por Túlio Cruse/ Folha Press em 11/06/2025 às 18:59

Rodrigo Costa/ Alesp
Rodrigo Costa/ Alesp

Marcello Streifinger, 58, principal cotado para assumir a SSP (Secretaria da Segurança Pública) em caso de saída de Guilherme Derrite, defende publicamente a ideia de melhorar a reinserção dos presos na sociedade, entre outras medidas do que chama de humanização do sistema carcerário. Ele está à frente da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) desde o início de 2023,

Ao mesmo tempo, coleciona brigas com os policiais penais e respondeu a ao menos um processo por abuso de autoridade durante a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos).

Como mostrou a Folha de S.Paulo, Derrite deverá deixar o governo estadual até o final do ano -ele afirmou que tem a intenção de antecipar sua saída e voltar ao cargo de deputado estadual.

Publicamente, Streifinger, coronel da reserva com mais de 30 anos de carreira na Polícia Militar de São Paulo, adota uma postura que destoa de Derrite. Não usa o próprio perfil em redes sociais para debater política, por exemplo.

Enquanto o secretário de Segurança encampa o discurso de tolerância zero contra criminosos, Streifinger tem destacado esforços para melhorar as oportunidades de trabalho e estudo para os internos. Sua eventual escolha, portanto, sinalizaria uma mudança de direção da política de Tarcísio na área de segurança.

“Tenho participado desse processo de humanização, isso é um caminho natural das coisas”, disse à TV Alesp no ano passado. “Nós temos de convencer a pessoa privada de liberdade que ela ainda tem um futuro a construir, e esse futuro depende dela.”

Streifinger comanda o maior sistema penitenciário estadual do país, com mais de 170 unidades prisionais e uma população carcerária de 213 mil presos. Uma das principais mudanças durante sua gestão foi a criação da Polícia Penal, que unificou duas categorias diferentes de agentes penitenciários e as equiparou às demais polícias estaduais (Civil, Militar e Técnico-Científica).

A regulamentação da nova carreira foi comemorada pelos servidores, pois dá proteção jurídica contra eventuais planos de privatização dos presídios. Também houve investimento em novas viaturas e uniformes.

Ao mesmo tempo, o sindicato da categoria diz que o secretário não cumpriu promessas de aumento salarial e de mais contratações por meio de concurso público.

Em 2023, o secretário chegou a ser investigado sob suspeita de abuso de autoridade, num caso que envolveu a apreensão de armas de cinco agentes penitenciários. Todos tinham tinham certificado de registro emitido pela Polícia Federal.

A SAP entendeu que eles não tinham direito de portar as armas pois não tinham as autorizações inscritas nas suas carteiras funcionais. Os cinco agentes, embora já trabalhassem em unidades prisionais, eram alunos de um curso de aperfeiçoamento que é pré-requisito para a autorização do porte de arma emitido pela própria SAP.

Foi de Streifinger a decisão de apreender as armas e levá-las a uma delegacia. Os agentes penitenciários foram mantidos por mais de cinco horas numa sala da Escola de Administração Penitenciária, na sede da SAP, mas não foram presos por porte ilegal.

Em depoimento sobre o caso, o secretário afirmou que não tinha outra decisão a tomar, “sob pena de prevaricação ou de condescendência criminosa”.

O sindicato dos policiais penais diz que o controle da SAP sobre o porte de arma é ilegal, assim como as apreensões, pois entende que o cargo lhes dá prerrogativa automática para o uso de armamento pessoal. O Ministério Público de São Paulo entendeu que não houve abuso de autoridade e pediu o arquivamento da investigação contra Streifinger e outras autoridades da cúpula da secretaria.

Sob sua gestão, a pasta abriu procedimentos administrativos disciplinares (PADs) contra funcionários por terem publicado críticas nas redes sociais à secretaria, a Streifinger e ao governador. A reportagem colheu relatos de três policiais penais que foram alvo desses processos internos.

Um deles diz que seu comentário chamava atenção para a má qualidade do atendimento médico prestado aos servidores e suas famílias, usando termos como “vergonha” e “humilhação” e afirmando que o secretário não conhecia a realidade dos servidores. Outro processo citava como justificativa o uso do apelido “Tarcinóquio” para a abertura da investigação.

Questionada, a SAP afirmou que as medidas disciplinares contra servidores “tiveram como base manifestações ofensivas, e não críticas às condições de trabalho” e que os casos ainda estão em andamento. “Os indícios de crime comum foram noticiados à Polícia Civil ou Ministério Público“, afirmou a secretaria, em nota.

Sobre a denúncia de abuso de autoridade, a pasta afirmou que “prestou todas as informações as autoridades competentes e o Ministério Público propôs o arquivamento”.

O coronel passou a maior parte da sua carreira na PM no setor correcional do Batalhão de Choque, responsável pela apuração de desvios de conduta de policiais. Foram quase 19 anos nessa área. Seu último cargo na corporação foi no comando do Centro de Operações (Copom), por dois anos e três meses, e antes disso chefiou o Comando de Polícia Militar Sudeste da capital.

Além da experiência no policiamento de rua, ele é coautor de três livros que servem como manual de direito penal militar. Foi instrutor de direito penal por anos no Centro de Altos Estudos de Segurança, onde fez mestrado e doutorado.

Dois oficiais da PM que conversaram com a reportagem disseram que Streifinger não demonstra ter pretensão de concorrer a cargos políticos. Afirmaram também que, em comparação com Derrite, o atual titular da SAP provavelmente teria mais facilidade de diálogo com os diferentes órgãos comandados pela SSP.

Esses oficiais citam a passagem dele pelo Copom -órgão central na comunicação com outras instituições- e suas credenciais acadêmicas para sustentar esse argumento.

“Desde a academia, sempre foi um aluno destacado, brilhante, muito correto e íntegro”, disse o coronel da reserva José Vicente da Silva Filho.

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