Transexual barrada em boate por usar roupa feminina será indenizada em R$ 10 mil
Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 20/05/2025 às 11:01

As pessoas transexuais têm o direito de receberem tratamento em conformidade com a sua identidade social. Com essa fundamentação, a 27ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) confirmou a condenação por dano moral de uma casa noturna que barrou o acesso de uma mulher transgênero porque ela vestia roupas femininas. O colegiado ainda elevou o valor da indenização a ser paga pela boate.
A decisão do colegiado ocorreu no último dia 16 de maio ao julgar os recursos de apelação das partes. Reiterando que foi impedida de entrar na casa noturna por conta de sua orientação sexual, sendo humilhada publicamente, a autora da ação pediu a majoração da verba indenizatória para R$ 20 mil. A juíza Daniela Almeida Prado Ninno, da 2ª de Vara do Foro de Barra Bonita, havia condenado a boate a pagar R$ 4 mil à requerente.
A casa noturna negou qualquer discriminação em relação à orientação sexual da demandante e postulou a reforma integral da sentença. Em suas razões recursais, o estabelecimento alegou que há normas para o uso de trajes no recinto e a autora não estaria de acordo com tais regras, pois usava “bustiê e minissaia curtíssima”. Porém, a boate ofereceu uma blusa e um shorts para a requerente vestir, mas ela os recusou.
Segundo o relator das apelações, desembargador Luís Roberto Reuter Torro, ainda que se alegue existir uma “etiqueta de vestimenta” para o local, tal afirmação feita pela empresa ré apenas reforça a versão da autora de que o seu ingresso foi impedido por trajar roupas femininas. Para o julgador, a requerente foi exposta a uma situação vexatória e manifestamente atentatória à sua dignidade.
“Constata-se que o caso em análise enfrenta com seriedade a delicada questão da discriminação contra pessoas cuja identidade de gênero diverge do sexo biológico”, avaliou Torro. Segundo o julgador, a situação extrapolou o limite do aborrecimento cotidiano, se configurou como indubitável preconceito e causou à vítima danos morais puros, ou seja, aqueles decorrentes da própria situação vivenciada.
Por essa razão, o relator negou provimento ao recurso da boate, porque a “sentença analisou corretamente todas as questões discutidas nos autos, mediante criteriosa avaliação dos fatos e das provas”, e deu parcial provimento à apelação da autora, aumentando a indenização para R$ 10 mil. A ré também deverá arcar com as custas processuais e os honorários sucumbenciais, fixados em 15% sobre o valor da condenação.
De acordo com Torro, o valor de R$ 10 mil guarda em si a devida proporção entre a lesão e a respectiva reparação, a condição econômica das partes e atende aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade. Além disso, é apto para compensar os dissabores sofridos pela autora e atingir a finalidade punitiva e a função educativa de tal reparação. Os desembargadores Rogério Murillo Pereira Cimino e Dario Gayoso seguiram o relator.

Foto: Reprodução/Vade News
Ingresso condicionado
O episódio ocorreu na madrugada de 5 de março de 2017, na casa noturna Tropical Dance. Acompanhada de algumas amigas, a autora, que adota o nome social de Hellen Monterromero Pinheiro, disse que foi proibida de entrar por estar vestida como mulher. Um funcionário afirmou que ela é homem e, para ingressar no local, deveria estar com trajes masculinos, a menos que exibisse documento provando ser do sexo feminino.
“Proibir que transexual ingresse em determinado local porque as suas roupas não coincidem com o seu sexo biológico viola a livre escolha de gênero, caracteriza preconceito, causa dano moral e gera o dever de indenizar”, sentenciou Daniela Ninno. Conforme a juíza, a prova testemunhal foi uníssona no sentido de que outras mulheres se vestiam como a autora e não foram barradas, acentuando a discriminação denunciada.
* Por Eduardo Velozo Fuccia / Vade News