Lei da cannabis medicinal emperra em Santos, mas prefeitura nega paralisação

Por Beatriz Pires em 16/12/2025 às 15:00

Reprodução/ Freepik
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Denúncias apresentadas em sessão na Câmara dos Vereadores de Santos apontam que o grupo criado pela Prefeitura para implementar o uso da cannabis medicinal na cidade está paralisado há um ano, e pacientes dependentes do composto têm sido prejudicados. A Prefeitura de Santos nega a paralisação e afirma que a distribuição desses medicamentos é uma atribuição da Secretaria de Saúde Estadual.

O objetivo inicial era colocar em prática a Lei Municipal Nº 4.431/2023, que prevê acesso gratuito a medicamentos à base do composto, além de criar protocolos e organizar a distribuição pelo SUS (Sistema Único de Saúde). O grupo é composto por representantes de diversas entidades, incluindo um membro indicado pelo Conselho Municipal de Políticas Públicas de Álcool e Outras Drogas (Comad).

“A paralisação do grupo de trabalho tem um impacto imediato e profundo, especialmente para as famílias de menor renda. Segundo o IBGE, em 2021 os medicamentos representaram 33,7% de todas as despesas das famílias com saúde”, explica Larissa Gonçalvez, pesquisadora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), que marcou presença na audiência.

Ela afirma que esse número é ainda maior entre famílias de baixa renda. De acordo com a Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo (SES-SP), a Farmácia de Medicamentos Especializados (FME) de Santos possui 29 pacientes cadastrados para receber a medicação atualmente.

Na audiência, foram apresentados depoimentos que apontam que se trata de um mercado milionário e que as associações têm a função de suprir a falta de ação do Estado. Larissa destaca que a ausência de políticas públicas fere os princípios do próprio SUS, que garante que a população tenha tratamento adequado onde reside. Sem atendimento na cidade, pessoas têm buscado serviço em municípios próximos, como São Vicente, o que sobrecarrega outras redes.

Síndrome de Dravet, Síndrome de Lennox-Gastaut e Esclerose Tuberosa estão entre os estados reconhecidos para tratamento com cannabis medicinal, sendo todas epilepsias refratárias. Os medicamentos atuam como anticonvulsivantes e redutores de hospitalizações por crises, atendimentos de emergência e internações. A pesquisadora explica que, além dos medicamentos à base de cannabis, essas doenças também requerem outros de alto custo.

“Santos tem uma trajetória histórica na saúde pública e na política de redução de danos. Implementar a lei da cannabis medicinal é, antes de tudo, retomar esse legado de inovação e compromisso com quem mais precisa”, reforçou Larissa.

A vereadora Débora Camilo afirma estar acompanhando o processo e diz que já vem pressionando o Executivo para a retomada do projeto. Novas reuniões já têm data marcada para o próximo ano e devem contar com entidades que participaram dos encontros anteriores, como professora e psicóloga Adriana Tucci; a integrantes da Iniciativa Negra por uma Nova Política sobre Drogas; Mães de Maio; o médico Felipe Mourão; a Associação Flor da Vida; além de famílias de crianças com deficiência ou condições médicas que fazem uso terapêutico.

Larissa afirma que o município tem autonomia e que atualmente não há impedimentos no âmbito municipal que impeçam a implementação. Ela cita municípios como Ribeirão Pires, que mostra, na prática, que garantir acesso seguro e contínuo à cannabis medicinal é possível, lá a primeira clínica pública de cannabis medicinal do país foi inaugurada no início de 2025. Ela reforça que o grande entrave é a falta de priorização dentro da gestão municipal.

“Para que o programa funcione, é preciso que a Secretaria Municipal de Saúde reconheça a importância do tema, ative o grupo de trabalho, estabeleça cronograma, defina protocolo clínico e integre o cuidado no território”, conclui Larissa.

Posicionamento da Prefeitura de Santos

Em nota, a Prefeitura de Santos nega a paralisação e afirma que a distribuição desses medicamentos é uma atribuição da Secretaria de Saúde Estadual. Ao município cabe a realização de ações de promoção de uma política municipal relacionada a esses medicamentos, tendo como base o diagnóstico de pacientes e a promoção de ações voltadas ao debate e conscientização sobre o uso terapêutico do canabidiol.

Por sua vez, a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo (SES-SP) informou, também em nota, que o fornecimento de medicamentos pelo SUS acontece desde 2024, por meio do Componente Especializado da Assistência Farmacêutica (Ceaf). O acesso deve ser solicitado mediante critérios clínicos, além da apresentação dos documentos e exames previstos nos Protocolos e Normas Técnicas Estaduais, disponíveis no site da SES-SP, na seção Guias de Orientações.

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