Juiz descarta erro judiciário e nega indenização a marinheiro preso por tráfico em barca
Por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News em 07/11/2025 às 05:00
A revogação da prisão preventiva no curso da ação penal e a posterior absolvição do réu não são suficientes para indicar eventual erro judiciário, causador de dano moral indenizável. Do mesmo modo, não representam tácito reconhecimento estatal de que houve suposta falha ao se decretar e manter a custódia cautelar por determinado período.
O juiz André Luis Maciel Carneiro, da 2ª Vara da Fazenda Pública de Santos, fez essa análise ao julgar improcedente ação ajuizada por um homem contra o Estado de São Paulo. Ele alega ter sido vítima de “arbitrária e injusta” prisão durante 371 dias, sob a acusação de tráfico de drogas e associação para o tráfico.
“Não se cogita de ilícito administrativo, uma vez que as exigências legais à decretação da prisão cautelar foram rigorosamente observadas e a posterior absolvição não se revela suficiente à desqualificação da decisão, tornando-a contrária ao direito”, anotou o juiz. Autuado em flagrante, o autor teve a preventiva decretada na audiência de custódia.
O julgador também destacou que a absolvição foi fundamentada na insuficiência de prova, o que “exclui a possibilidade de erro grosseiro judicial, tanto na conversão da prisão em flagrante em prisão preventiva quanto nas diversas decisões que a sucederam, indeferindo pedidos de concessão de liberdade provisória ou mesmo relaxamento”.
Fuga a nado
Com base em investigações da Polícia Civil, que apurava esquema de distribuição de drogas de Guarujá para outras cidades do Estado, valendo-se de barcas de passageiros para o transporte do entorpecente, o Ministério Público (MP) denunciou o autor e outros acusados de envolvimento no esquema.
A prisão em flagrante do demandante ocorreu no dia 12 de maio de 2021. Nessa ocasião, ele trabalhava como barqueiro amarrador no transporte hidroviário de passageiros entre os municípios de Santos e Guarujá. O autor estava em uma lancha junto com o marinheiro e um único passageiro, que teria fugido pulando no mar.
Esse passageiro não chegou a ser detido e sequer identificado. Ele teria deixado na embarcação uma mochila, na qual havia tabletes de cocaína e maconha totalizando, respectivamente, 12,2 e 4,3 quilos. Assim como o seu ajudante, o marinheiro também foi preso em flagrante e absolvido por insuficiência probatória.
Pelo pretenso erro judiciário que alega ter sido vítima, o barqueiro amarrador pediu indenização de R$ 124,7 mil a título de dano moral. Ela também pleiteou R$ 43,2 mil por dano material, consistente em lucros cessantes, considerando o seu salário e o tempo de encarceramento, que se estendeu até 18 de maio de 2021.
Convencimento motivado
Segundo os advogados do autor, ele ficou preso preventivamente por mais de um ano de forma injusta, sem qualquer relação com os crimes supostamente praticados. “Por meio de uma singela leitura dos autos, verifica-se que não havia uma única prova contra este capaz de ensejar a manutenção de sua prisão por tanto tempo”.
No entanto, André Carneiro ressalvou que a revogação da prisão cautelar e posterior sentença absolutória não implicam em constatação de erro judiciário ou abuso de poder, porque a decretação da preventiva e os indeferimentos dos pedidos de sua revogação foram fundamentados conforme o cenário fático-processual da época de tais decisões.
“O julgador cumpriu o seu mister na forma da lei, que não se vincula ao resultado final da demanda” concluiu o titular da 2ª Vara da Fazenda Pública de Santos, ao se referir às decisões do juízo das garantias, que presidiu a audiência de custódia e decretou a preventiva, e do juiz natural da causa, que a ratificou.
Subsequente revogação da prisão pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) foi tratada como normal por Carneiro. “Não obstante o convencimento posterior em sentido contrário, destaca-se que não há prejuízo à afirmação da regularidade técnica das decisões anteriores, ressaltando que vigora o sistema do livre convencimento motivado”.

Manifestação
Parentes, amigos e colegas de trabalho do marinheiro e do seu ajudante consideraram injustas as suas prisões e realizaram manifestação em frente ao Terminal de Passageiros Edgard Perdigão, em Santos. Durante uma hora, o serviço de travessia de barcas entre a Ponta da Praia e a Praia de Santa Cruz dos Navegantes, em Guarujá, ficou suspenso.
O ato aconteceu na tarde de 17 de maio de 2021 e reuniu cerca de 200 pessoas, conforme estimativa dos organizadores. Os manifestantes vestiam camisetas brancas com as fotos do marinheiro e do ajudante na frente, sob a palavra ‘Justiça’. Na parte de trás foi inscrita a frase ‘Se a Justiça é cega, vamos fazê-la enxergar’.
*Texto por Eduardo Velozo Fuccia/Vade News