27/11/2025

Congresso derruba vetos à lei de licenciamento ambiental em derrota para Lula após COP30

Por Caio Spechoto, Carolina Linhares e Victória Azevedo/ Folha Press em 27/11/2025 às 18:59

Divulgação/Senado
Divulgação/Senado

Menos de uma semana após o fim da COP30, o Congresso Nacional derrubou nesta quinta-feira (27) 56 dos 63 vetos do presidente Lula (PT) à lei de licenciamento ambiental. O resultado é mais uma derrota para o governo no embate com o Legislativo.

Na Câmara, foram 268 votos para derrubar 24 vetos e 190 para mantê-los. No Senado, o placar foi de 50 a 18 pela derrubada. A sessão reúne as duas Casas de forma conjunta.

Outros 28 vetos analisados de forma separada, a pedido do PT e do PSOL, também foram derrubados —295 a 167 na Câmara e 52 a 15 no Senado.

O texto da lei de licenciamento ambiental flexibiliza etapas e amplia autorizações automáticas para obras e empreendimentos no país. Defensores afirmam que a lei simplifica o licenciamento, enquanto, para críticos, ela fragiliza a proteção ambiental —tem sido chamada de “PL da Devastação” por ambientalistas. A bancada ruralista é a principal fiadora da proposta.

O presidente da República tem o direito de vetar total ou parcialmente projetos aprovados pelo Legislativo. O Congresso, porém, pode rejeitar os vetos e fazer os projetos vigorarem da forma como foram aprovados.

O licenciamento é uma análise dos possíveis impactos ambientais para empreendimentos como obras, exploração de petróleo e minérios. As mudanças previstas podem impulsionar atividades de risco, como a mineração, obras de infraestrutura, do Novo PAC e a BR-319, e enxugam instrumentos de consulta a comunidades afetadas por estes empreendimentos.

A lei cria instrumentos como a Licença Ambiental Especial (a chamada LAE), que permite ao governo classificar projetos considerados estratégicos para uma análise simplificada, mesmo com potencial alto de impacto.

Cria ainda a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que dispensa avaliação individualizada para atividades de pequeno e médio porte. A proposta também isentaria setores inteiros do licenciamento, como áreas do agronegócio e saneamento, reduziria a participação de comunidades afetadas e limitaria a proteção de territórios indígenas e quilombolas apenas aos já homologados ou titulados.

Em agosto, Lula vetou 63 pontos da lei. Na quarta-feira (26), véspera da votação, o governo divulgou uma nota elencando os objetivos dos vetos, entre eles “proteger o meio ambiente em todos os biomas, bem como a saúde da população brasileira”.

“O Governo do Brasil agiu dessa forma considerando o preocupante cenário de desastres climáticos extremos, que impõem riscos às famílias, à economia e ao meio ambiente. A eventual derrubada dos vetos pode trazer efeitos imediatos e de difícil reversão”, diz o texto.

Há ainda sete vetos à lei de licenciamento que não foram apreciados nesta sessão e que tratam da LAE, patrocinada pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). O adiamento foi acordado entre governo e oposição, já que a LAE também está em análise em uma medida provisória em tramitação.

A medida foi, inclusive, editada pelo governo em agosto como forma de atender parte das reivindicações do Congresso, em uma espécie de contrapartida aos vetos. Na ocasião, o governo também apresentou um novo projeto de lei para rediscutir os pontos mais sensíveis do licenciamento.

A LAE permite ao governo federal escolher projetos, por meio de um conselho político, que passam a ter prioridade no processo de licenciamento. O modelo pode acelerar projetos considerados estratégicos, como a exploração da Foz do Amazonas, autorizada em outubro.

A derrota do governo nesta quinta é mais um reflexo da atual crise entre o Palácio do Planalto e a cúpula da Câmara e do Senado. Na quarta, tanto Hugo Motta (Republicanos-PB) quanto Alcolumbre faltaram ao ato de sanção da isenção do Imposto de Renda, explicitando o desgaste político.

Como revelou a Folha de S.Paulo, o presidente da Câmara rompeu relações com o líder do PT, Lindbergh Farias (RJ), o que agravou a tensão na relação com o governo e ameaça a agenda do Executivo. Já Alcolumbre foi contrariado por Lula na escolha de Jorge Messias para o STF (Supremo Tribunal Federal), o que já desencadeou retaliações, como a aprovação de uma pauta-bomba no Senado.

Na sessão, Alcolumbre fez um discurso para se defender de críticas que disse ter recebido por ter pautado a análise dos vetos e negou que se trate de retaliação ao governo.

“Deliberar sobre vetos presidenciais é parte essencial do processo legislativo. Qualquer tentativa de transformar isso em disputa política desconsidera o papel institucional do Congresso Nacional. A votação desse veto não é um gesto político isolado, é uma necessidade institucional”, disse.

Ainda segundo Alcolumbre, a análise dos vetos era necessária antes da votação das outras propostas que tratam de licenciamento. “Votar esse veto é fundamental para destravarmos o tema do licenciamento ambiental como um todo, estabilizando o marco legal, dando previsibilidade jurídica e permitindo que o Congresso avance nas demais matérias.”

A avaliação do governo é a de que a derrubada dos vetos logo após a COP é especialmente prejudicial. Na leitura dos governistas, o Planalto buscou ceder e atender ao Congresso em relação ao licenciamento ambiental, pois, apesar dos vetos, ofereceu uma medida provisória e um novo projeto sobre o tema.

Agora, os governistas apostam na pressão da sociedade contra o resultado e não descartam que haja judicialização por parte de entidades da sociedade civil.

A ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais) afirmou, nas redes, que a derrubada dos vetos “contradiz o esforço ambiental e climatico do governo que acaba de realizar a COP 30”.

No plenário, o deputado Ivan Valente (PSOL-SP) afirmou que a derrubada dos vetos vai levar à judicialização, além de “expor o Brasil à vergonha internacional”. Já o líder do PL na Câmara, Sóstenes Cavalcante (RJ), comemorou a “lavada” tomada pelo governo, em suas palavras.

Um dos principais pontos defendidos pelo Congresso era o de que o projeto dava maior autonomia para que órgãos ambientais de estados e municípios pudessem criar suas regras de licenciamento. No entanto, especialistas consideram que o texto criava insegurança jurídica ao permitir regras concorrentes entre os diferentes entes federativos.

A lei ainda permite a emissão da licença mesmo para empreendedores com o CAR (Cadastro Ambiental Rural) pendente. Dispositivos do texto ainda revogam trechos da Lei da Mata Atlântica e beneficiam empreendimentos na região Norte.

A legislação também restringe as áreas protegidas que devem ser consideradas na análise ambiental apenas às Terras Indígenas homologadas (fase final da demarcação) e Territórios Quilombolas titulados (oficializados), excluindo processos de regularização em andamento.

Porém, quando julgou o Código Florestal, em 2018, a maioria do STF decidiu “declarar a inconstitucionalidade” de um dispositivo que criava exatamente esta mesma limitação.

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